domingo, 30 de novembro de 2014

Tarde de ressaca





Tecidos bordados em camas que não se podem dormir.
A goma esticada, beleza que não pode vestir.


Sentava debaixo da mesa com o prato de goiabada com queijo enquanto dona Carminha passava e engomava a roupa do dia. Adorava aquele carinho doméstico. Passava tardes e tardes na tranquilidade da minha vida colégio e nada mais.

A tarde é um tempo. Que cabe num dia. Que digere em entrecorte o manhã e o anoitecer.
Uma marcação bem bate estaca.

Tardes na varandinha
chão quente do sol da manhã.
Sensação da ressaca de quem veio do mar

A flauta,

A verdade num lampião
de lata de leite ninho
o ressonar dos morcegos
dentre as folhas de jambo
espionando a noite

Amanhã tem escola
e toda aflição de entornar
o cedo do dia
o enjoo refletido
na rotina de farda
tecido pesado
calor insuportável
do meio-dia

A tarde de volta
a remendar a vida
Barro tomando forma
Depois da fornalha

Descompressão

Alinhamento
do conforto
mental

Cochilo
a sombra
a brisa
o chiado
a cigarra

solidão bem vinda
infância
Introspecção

Amizade
Entre o primeiro e o terceiro
andar

Patins em rua de terra
marcando as rodas
O jogo de bola
Thiago e Mariana.









sábado, 22 de novembro de 2014

De noitinha encostava as costas na cadeira que levava pra calçada.
Mãe já não vivia mais e casa só de mim costumava. Tomava um banho e tirava a alfazema de dentro da cômoda, prendia as pontas do mosquiteiro nos lastros da cama. Pegava o cigarro que desde muito cedo enrolava. O cheiro e o gosto do fumo amolecia o espinhaço da rotina crua que misturava o profano e o espiritual.
Na redinha da sala lia tudo que os compadres da cidade traziam. Tinha muita leitura que me divertia. Ajeitava a gola da camisa, recuava os olhos estremecendo os músculos e a espinha. Sentava-me na beira da cadeira, pousava o cigarro na boca seca. Levantava-me como quem se prepara para não morrer. O passado começava a reconstruir-se dentro de uma espera. Tocava com o polegar e indicador o pingente em seu bósforo. Fechava os olhos e esperava um pouco todas as falácias se aquietarem e por momentos sentir o forte apego por sua voz. Ela estava ali misturada dentre a ressonância das outras vozes. Muitas vozes. A reverberação e a distinção de tudo que faz sentido.

Ficar só é cintilar e perceber o ciclo.



quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Cecília vivera mais




Dias sem o tempo e a complicação das ruas da cidade, do cheiro irritado e miserável de quem busca o que nem sabe achar. As migalhas dos lugares ocos, os porres de uma vida amarga. Era mesmo um nervo a cada cigarro e no findar do dia, sobrava a expectativa de um amanhã diferente. O sabor da sujeira na alma era o pior de tudo depois de passar por tanta gente que traz a mediocridade nas veias as feridas expostas. Então mais um cigarro para ver que quem está do lado é mero prazer sobrevivente que levanta da cama antes que a noite acabe. A mais louca ilusão que sentia Cecília, o vazio.
Era assim que voltava para casa, exausta, sentada no banco do ônibus e fumava o último cigarro daquela madrugada. Nesse instante  parou e lentamente olhou para si como se desconhecesse aquelas mãos, as unhas num vermelho vivo, estava cansada de tudo. Mais uma vez não entendia por que estava voltando ou  por que procurava aquele apartamento do outro lado da cidade. Não era seu mundo. A começar pelos sobrados de cômodos claustrofóbicos. Talvez aquela realidade fria trouxesse algum prazer, ou quem sabe a forma com que todos ali buscavam a felicidade. Era  como se os impulsos inquietassem mesmo a vida. Não querer entender, apenas sentir. Isso era tão importante.Foi assim que Cecília sentiu Antônio, como um devaneio a cada semana no cúbico espaço em que morava.
Amor bruto. Se é realmente esse o nome do devaneio mais inimaginável de Cecília. Mulher sensível a buscar o gosto de um homem de barba mal feita.
E como num ritual uma vez por semana, chegava e sabia o quanto era bom esperar Antônio e seus rompantes eufóricos e as mãos que tocavam suavemente. Euforia que se traduzia numa intensidade lenta a percorrer a noite.
A verdade é que para Antônio ela era o amor que nunca teve. A mulher doce e sensível de traços delicados.
E nesse medo de perder e mais ainda no de se achar é que Cecília começara a perceber naqueles olhos o que chamara de bruto amor. Era mesmo bruto, pois o que não tinha amarras, apavorava.
Era a falta de limites, sentir, mas a sensação de liberdade não existia. A ilusão de que podia chegar e sair sem hora e sem ninguém a lhe cobrar mero gesto de apego.
O fato é que nunca conseguiu entender que fugir fosse pior do que esperar o dia amanhecer e aceitar o quanto queria voltar quando a noite batesse.
Bruto amor era não se deixar.
Não sentir o gosto da água nos lábios ressecos de tanto falar em silêncio, era negar apego tão grande por quem só lhe fazia bem.
Mas como estranhava tudo quando deixava aquele canto. Mas do que nunca criara dentro dela aquele lugar que respirava o silêncio do
mundo. Forma insana de amar. 

Cecília vivera mais, o que não tinha de ser.


sexta-feira, 14 de novembro de 2014

A paixão nasce como quem vive.


Os planos como estão na cabeça, como areia, que às vezes montam figuras e outras se embaralham e não tem sentido tão certo. Os escudos estão todos nos punhos, todas as mortalhas desembaralham e o futuro segue como pasto. O celeiro descomunal cheio de revanches. Ando e ando por um mundo com tantas pessoas e tantas pessoas genéricas. Recorro a pecados que se podem ser revelados. Avanço sem os conselhos alheios e me alheio a uma fartura de pensamentos. Eu vivo com tantos pensamentos e tento não me carregar de ninguém. Assim saio de todas as salas com quartos na cabeça mas nenhuma perspectiva. Nenhuma criatura e apenas a lembrança de uma bicicleta que vai bem longe e uma pessoa que carrega o que não quero mais saber.

Pessoas demais começam a me incomodar. Estou bem certa de toda a vaidade que quero, estou tão solta e passo horas tentando perder as horas, tentando entornar o sangue dentro de cada vontade de não falar quase nada.

O passado estatelado como o asfalto de Nelson, a opinião não me assusta e nem a historinha dos sexos dos anjos. A paixão nasce como quem vive. A natureza é tão digna e fiel ao amor que não negrita e permanece inteiro. Deita em mim, amor preferido. Me tira os pedais, me deixa deitar e encontrar pouco a pouco toda a minha verdadeira vida.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Fantasia

Romper com a caricatura
Com o EGO
complacente

Romper com
A CULPA

com a culpa, culpa
Se afastar
do EU
e do OUTRO

Se afastar do
OSSO

SER forte
e amargo.

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Um par sem filtro



Eu queria tanto ser tua amizade
Para te olhar em acompanhamento
Para saber da tua oração diária
E por assim,
Desembaçar a liberdade
Anteposta ao teu sinal de vaidade

Queria ver os teus chinelos
Virarem os saltos
Invulgares, delicados
um cavalo

em trote elegante.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Pensar em Marrakesh






Agora eu caminho e caminho acima da atmosfera.
Vivo criando e recriando tensões superficiais
na água não me afogo
Ando fechando todas as valas e deixando a indigência pra trás.

Começo a gostar.

Encontro os destemperos, eu comungo e danço
das donzelas e dos aflitos.

Eu penso em palavrões demais.

Enquanto eu me acostumo, assim como preparar o fumo dentro da palha
espero a tua chegada

Eu tenho uma marca na moleira.
Tenho um passado desgraçado.

São tantos panos na manga.
ânsia
medo
ânsia
medo
de perder o tino
de estar dentro
da vida.






terça-feira, 4 de novembro de 2014

A tua presença

O silêncio cansado
daqueles que não leva a nenhum sentido.
Aos quase 32 anos,
Já necessitei
dos teus quadris,

Dentre um passado
entre os limites outros
descobri
a ter amores
e não continuar
pelas calçadas
que reprime
e imprime todo
todo meu descontentamento.


sábado, 1 de novembro de 2014

Era uma vez uma apatia

Olhava-o sempre de longe. Ele era uma pessoa bonita e apático.
O que tinha de constância, de opaco de água e pão.
Altamente necessário para ocupar um posto bem singelo no meu peito.
Era toda certeza que que não queria pra mim, sabia exatamente os seus atos e toda falta de atitude.
Um homem que nasceu de barba, algo de velho em plena juventude.
Era nada do que queria neste momento.
Uma pessoa premeditadamente sem delírios. E essa vida é chata demais pra suportar e ter que cozinhar em banho-maria.
Tantas camisas brancas a pendurar no varal.

E o meu vazio descompassou bem dentro da ironia.
O meio termo, por favor. O preto e o branco revesando nos meus desvarios.
Atitude esta de colocar
viajantes no meu quintal.
E eu loucamente assustada nesse mar insípido, jogando silêncio no rio que não aguentava de tanta revolta.

A morte acompanha a vida.

É o que penso. sinto a fragilidade de viver Deus sabe como se estivesse pronta acompanhando o meu mundo mundo imantado meu silêncio pensamen...